quarta-feira, 28 de junho de 2017

Retorno de Saturno

Dentro de um Uber com a Yumi conversando sobre a vida, questionei.

"Você acha que fui muito louca?"

"Nãããão. Nããão. Não. Não...É. Você é louca, né? Mas neste caso eu acho que você foi muito corajosa, na verdade."

"Acho que exigiu um pouco de coragem mesmo."

"Muita! Você é muito corajosa! Uma coisa que nunca poderão falar de você é que você é covarde. Você é uma das pessoas mais corajosas que conheço, mas você precisa entender que as pessoas no geral são covardes. Por isso você é tão diferente, e isso às vezes pode ser considerado loucura porque as pessoas não conseguem se ver tomando este tipo de atitude. Geralmente estamos acostumados a simplesmente deixar, a não agir e evitar confrontar algo ou alguém que às vezes nos faça pensar muito em algo que é tão confuso dentro da gente, como os nossos sentimentos."

"Foi bem confuso mesmo."

"Claro que foi! Mas o bom é que você foi sincera com você mesma! Fez exatamente o que estava com vontade de fazer na hora sem afetar o que você também sabia que precisava ser feito pela Harumi do Futuro. Aliás, de tudo que você contou, essa foi a parte que eu mais achei doida: VOCÊ, HARUMI, nossa arianinha impulsiva que não consegue pensar no que fazer daqui dois dias, pensou no impacto disso pra você a longo prazo e não escolheu ficar na situação cômoda de viver um dia por vez como se não houvesse amanhã, por que um dia de fato não terá - mas em todos os outros dias da sua vida tem um amanhã, sim. Você entende o que eu estava falando antes? Essa sua mudança de comportamento, essa coisa de parar de só pensar no presente, isso tudo que está acontecendo: é o Retorno de Saturno!"

Elogios (e conceitos do Retorno de Saturno que eu não manjo tanto assim para opinar sobre) à parte, a Yumi é bem sábia, né? Sempre me impressiono.


Escrito em junho de 2017

segunda-feira, 19 de junho de 2017

SÃO BORJA, pt II

SÃO BORJA, pt II
Como Descobrir Que A Praga Continua Em Você

(São Borja, pt I aqui)

Situação: Trabalho.

Cenário: Aduana da Fronteira entre Brasil e Argentina em São Borja (parece uma rodoviária, tem um prédio central e ao lado duas partes cobertas, mas abertas, onde entram e saem os carros passando pela inspeção para entrar ou sair do Brasil/Argentina).

Perfil: Eu era supervisora de uma equipe de pesquisa para o Ministério do Turismo (sintam a pompa novamente, porque daqui a pouco ela some...novamente).

Época: Verão de 2015.

Acontecimento: Então é assim...

Em 2012 fui trabalhar em São Borja e relatei um super esborrachamento que tive. Caí de costas na quina da calçada na Fronteira durante um temporal, fiquei com as costas travada e lama no ouvido. Além disso perdi o sapato.

Mas em 2015 a Praga de São Borja continua...

Então eu voltei pra cá pelo mesmo trabalho e há uns dias atrás eu pensei "como está quente no quarto, vou abrir esta janela (pesada, velha e gigante) do hotel". Agora eu sei que não foi esperto, mas na hora não parecia algo que eu seria incapaz de conseguir fazer - no entanto era: quando eu estava quase conseguindo abrir (ela estava emperrada), ela fechou em cima do meu dedinho, que está roxo, verde, azul, inchado e torto, além de muito dolorido. Fui no hospital e me chamaram de Karine Naram (será que eu falo o meu próprio nome errado? Porque aqui nas cidades da Fronteira do Rio Grande do Sul nunca acertam a pronúncia), marcaram que eu nasci em 2012, arrumaram a data porque claramente não pareço tão jovem assim a ponto de ser confundida com uma recém-nascida e fizeram o curativo.

Então ontem eu dei uma tropeçadinha durante o trabalho e fiz a piada "Só falta eu não moer o dedo na janela, mas quebrá-lo caindo em cima dele! Tem que ser muito lerda, né? ha-ha-ha".

A graça estava na certeza de que isso não aconteceria. Porque de fato seria muita lerdeza.

Mas pouco depois, eu cai sozinha no chão. 

Sozinha. 

E em cima do dedo. 

Não tinha vento, não tinha chuva, não tinha paralelepípedo, calçada, barro, chão molhado, não tinha nenhuma desculpa...só o asfalto que me ralou toda. Voltei ao hospital  e as pessoas me perguntavam se caí de moto, de bicicleta, se caí no barranco, fui empurrada ou se caí do cavalo (isso parece comum lá).

"Não, eu caí sozinha"

"Tem certeza?"

"Tenho."

Na recepção a moça que estava fazendo minha ficha começou a rir porque minha residência tinha sido marcada como o próprio hospital (pela outra moça que marcou que nasci em 2012) e soltou seu bom humor de alguém não ralado e com o dedo intacto:

"Pelo menos já tá em casa, né? Tem certeza que tu não foi atropelada? ha-ha-ha".      

Fiz os curativos, descobri que o enfermeiro conhecia Lorena (a cidade onde cresci), que ele era meio sádico ("Olha aqui eu tirando as pedrinhas no seu machucado! Quer ver?! Tem um monte!") e disse que já viu uma pessoa que foi pisoteada por um cavalo que se machucou menos e ficou abismado como consegui fazer isso sozinha (pensando depois, pelas perguntas e o rumo que ele levou a conversa, acho que ele estava preocupado se eu havia sofrido violência doméstica ou algo assim - o que sempre é uma preocupação válida e bacana).

Perguntaram se eu era parente da Carol Nakamura (e fizeram essa piada umas 10x, pq São Borja não tem muitos orientais e não conseguiam pronunciar Karen Nomura sem hesitar em alguma sílaba) e, enquanto eu esperava para ser atendida pelo médico, a moça da ficha que no fundo é uma querida (como dizem aqui) cruzou meu caminho e finalizou esta saga com sua visão positiva da situação:

"[...] Alguém lá em cima gosta muito de ti, tu conseguiu se esfolar toda mas sua roupa tá inteirinha! Como isso, né? É sorte!"

Geralmente eu abraçaria esta visão, mas como estou muito dolorida me permiti pensar:

Aham.

Deve gostar pra caramba.

Muita sorte.



Considerações posteriores

Obs.: No hotel eu vi que a calça rasgou.

             
Considerações finais

Beijos pra todos e não caiam ou deixem a janela fechar em seus dedos, pode ser chato, dolorido e inconveniente.



Escrito em janeiro de 2015

sexta-feira, 16 de junho de 2017

Medo de abraçar

Estava voltando para casa depois de um dia comum de trabalho, quando antes de antes de ontem, eu e minha grande mochila esbarramos em alguém.

...E quebramos um pouco nossa rotina.

A princípio eu nem notei quem era, mas eu senti o tranco e no automático pedi desculpas para quem estava à minha esquerda. Com o meu fone de ouvido, confesso que foi uma ação automática e não esperava nenhuma resposta além das variáveis de "tudo bem" ou "imagina" ou mesmo um xingamento, mas quando olhei vi que o menino estava falando algo.

Era um rapaz não muito mais velho do que eu, talvez até mais novo. Estava com uma roupa bem desgastada, mas de certa forma "estiloso" (isto me faz lembrar da minha irmã falando que o estilo está muito mais na presença da pessoa do que no que ela veste). 

Como pela minha rápida leitura labial aquilo parecia uma frase maior do que qualquer uma das frases que eu esperava, eu tirei o fone.

"Desculpa, eu não escutei." Eu disse.

"Eu tinha perguntado se você não ia me ignorar."

Ele disse isso com uma mistura de "cara de nada" com "sorrisinho de educação", aquele sorriso que os olhos não se mexem, só as bochechas que se levantam levemente. A pergunta me pareceu tão estranha que eu continuei com a mesma cara em silêncio, o que fez parecer que na verdade eu estava ignorando. Quando caiu a minha ficha sobre isso eu respondi:

"Desculpa, eu não entendi. Te machuquei? Você precisa de alguma coisa?"

Aí quem ficou em silêncio foi ele, mas a cara dele não estava a mesma. Agora ele também sorria com os olhos e arrisco dizer, com o coração.

"De mais pessoas como você."

Agora o silêncio veio de ambas as partes.

Foi uma boa resposta que ele deu, não foi? Eu achei.

Normalmente eu demoro para entender frases pouco contextualizadas, e por isso mesmo, por um segundo eu achei que não tinha entendido direito.

"Oi?"

"Eu preciso de mais pessoas como você." Ele repetiu.

Não sei quem lacrimejou primeiro, eu ou ele.

Eu nem sabia direito porque estava lacrimejando e como aquilo me afetou tão rápido. Mas de repente o contexto parecia óbvio.

"Ninguém nota a gente, muito menos liga se a gente precisa de algo. Foi legal."

Eu sorria demonstrando empatia, mas continuava quieta porque eu não sabia o que dizer.

"E pensar que eu tava sendo sarcástico contigo e você nem notou. É que sem amor o coração vira pedra e a gente começa a ficar meio assim. Aí um pouquinho de amor que você deu e já to todo sensível (ele ainda estava lacrimejando). Foda o ser humano, né?"

Ele tentou me abraçar e ele mesmo se embananou e se reprimiu... "Tanto tempo que ninguém nem me nota que acho que até esqueci como faz isso."

Eu continuei imóvel pelos 2 segundos que tudo isso aconteceu.

Tão logo ele seguiu o caminho sorrindo e dando tchau, fiquei com isso na cabeça: se devia tê-lo abraçado bem forte de verdade. O pensamento foi evoluindo e me perguntei quanto tempo devia fazer que ele não recebia um abraço. Pensei em como eu gostava de dar e receber um abraço e que é uma das coisas que faço automaticamente quando estou feliz! E ele parecia feliz! Teria sido bacana!

Como é ruim ter medo de abraçar, não é?
Eu não me acostumei com isso, eu sempre fico triste quando penso que a nossa condição social às vezes determina até quanto amor a gente recebe. Espero que ele logo tenha várias oportunidades de se lembrar como é abraçar alguém, inclusive eu mesma se eu não paralisar novamente.


Escrito em janeiro de 2017

sexta-feira, 9 de junho de 2017

Meu namorado Shazam

Esta semana, de forma semi-impulsiva, comecei a academia.
E esta foi uma das primeiras interações (com pessoas) que tive neste novo ambiente:

Eu
"Que música é essa que tá tocando?"

Instrutor
"Eu não conheço..."

Eu
"Peraí."

Peguei o celular e...

Instrutor
"Ká!! Você não pode interromper a sequência pra ficar de conversinha no celular! Tem que ter foco!"
(ele disse isso de forma simpática apesar das exclamações)

Eu
"É rapidinho, só o Shazam!"

Instrutor
"ESSE é o nome do seu namorado?!"

Eu
"N~~ãã~ãaãaoo (mas seguindo a lógica das pessoas que já gostei na vida, poderia muito ser)! É o aplicativo mais sensacional do mundo pra descobrir a música que tá tocando! Ó! Pronto! Você disse que não conhecia! A música já estava acabando, se eu não pegasse agora eu ia passar o resto da minha vida procurando! Sério! Eu tenho tique com músicas...Não ia conseguir focar em nada até encontrá-la!"

Instrutor
"Eu realmente ia achar isso menos estranho se fosse o nome do seu namorado."


Em resumo: Estou feliz de ter começado na academia. Se eu não ficar mais saudável, ao menos tenho uma nova música legal na minha playlist.



Escrito em junho de 2017

Música encontrada pelo Shazam, meu namorado

Fitz and the Tantums - HandClap