segunda-feira, 2 de outubro de 2017

Bom dia!

Sempre que chego a Lorena a primeira coisa que faço é trocar de roupa. Visualmente falando me torno uma pessoa completamente diferente do que sou hoje em São Paulo quando chego a Lorena, volto a ser a “Karen com 15 anos”, pois uso as roupas dessa época, que no geral são camisetas e bermudas de colégio. Na verdade gosto da despreocupação que Lorena me passa quando se trata de vestimenta. Em São Paulo me acostumei a sair com roupa para todo tipo de ocasião porque nunca sei como será o dia, então visto roupa para reunião de trabalho, atividade esportiva, festa e que possa se tornar um pijama facilmente se precisar dormir fora. Sem contar a variação climática, o que me faz sair com várias camadas para enfrentar chuva, sol e quem sabe, considerando as coisas como estão, até neve.

Então mais uma vez eu chegava a Lorena, desta vez para passar o Dia das Mães com a minha mãe. Cheguei sábado bem cedo e mal havia deixado as minhas coisas em casa e minha irmã já havia saído para levar o então namorado dela, hoje marido, para a rodoviária para que ele pudesse também passar o fim de semana com a mãe dele em São Paulo.

Tão logo troquei de roupa, já saí correndo em direção à rodoviária para me despedir do meu cunhado. São uns 20 minutos de caminhada, mas no final, mesmo saindo às pressas, acabei não chegando a tempo de “dar tchau” para ele, porque no meio do caminho conheci a Bertina.

Já estava na rua da rodoviária quando encontrei uma senhora (de uns 65 anos) catadora de recicláveis com aqueles carrinhos de mão invertido, ou carroça, como ela mesma chamou. Em São Paulo encontro o pessoal puxando isso em quase todo bairro, é algo “comum”, mas em Lorena eu vi dois, um moço, um pouco antes de encontrá-la, e ela. E não sei se sempre fui negligente, mas não me lembrava de ter visto esse tipo de carroça antes em Lorena – e encontrar um atrás do outro foi o que me chamou a atenção, o que em São Paulo talvez eu nem notasse. No interior já vi várias carroças puxadas por cavalos, jegues ou mulas e isso era completamente comum – mas por pessoas me parecia uma “novidade vinda da capital”.

Meu grande defeito de não saber disfarçar quando eu fico concentrada em algo, me fez ficar encarando-a, filosofando acerca do peso, do cansaço, do cheiro, do desconforto e de que parecia muito triste ver uma senhora, num sábado tão bonito, trabalhando em algo tão penoso. Confesso que quando estou com pressa eu me desligo do mundo e fico o caminho todo mentalizando como chegar no horário e eventualmente, quando vejo que não vou chegar, pensando em como me explicar, mas aí eu a avistei e me distraí ainda mais quando ela me notou e ao invés dela se sentir incomodada, como eu esperaria, foi tão simpática e me deu “BOM DIA!”.

Assim, feliz!

Ela sorriu e foi quando notei que eu devia estar descaradamente encarando-a.

Estávamos andando lado a lado e a segunda coisa que eu disse (após responder com outro “Bom dia!”) foi: A senhora quer ajuda?

E é lógico que ela queria.

Era um sábado realmente bonito, a rua estava tranquila, então ela colocou a carroça no chão e trocamos de lugar.

Desequilibrei-me pra levantar a carroça e começar a puxá-la, ela esperou eu me ajeitar e começou a andar do meu lado. Fomos conversando o caminho todo até a rodoviária, nos apresentamos e ela perguntou de onde eu era e o que fazia ali. Falei do Dia das Mães e ela contou sobre a sua neta, que também se chamava Karen.

- E porque a senhora não está com ela aproveitando o Dia das Mães?

- Ah, eu vou aproveitar, mas é só amanhã! Hoje ainda trabalho pela mesma razão que todo mundo, né? A gente tem que viver e o dia hoje tá bom pra isso!

- Pra viver?

- Pra viver também, até porque não dá pra pular o dia pra isso. Mas digo para trabalhar.

A conversa continuou leve por todo o percurso: uma linha reta de uns 10 minutos de caminhada. E apesar disso, eu falava quase no automático enquanto dividia os meus esforços entre a necessidade física de carregar aquilo e a mental de entender tudo o que ocorria:

Era um trecho minúsculo e todas as pessoas que estavam ou passavam na rua olhavam encarando como provavelmente eu estava fazendo quando a encontrei. Isso é um pouquinho constrangedor, ao menos eu não me sentia confortável com a situação, então resolvi dar “Bom dia!” sempre que alguém olhava fixamente, como a Bertina. Achei que tinha sido bacana da parte dela então copiei – a diferença é que ninguém respondeu. Mas se fosse só isso, dava para se acostumar, mas como achar normal uma pessoa dentro de um carro confortável buzinar e abaixar o vidro da janela só para dizer “VOCÊ ESTÁ ATRAPALHANDO A RUA, SUA IDIOTA!” enquanto te ultrapassa passando bem rente como se ameaçasse te atropelar? Eu confesso que queria mandar o carona à merda, mas ignorei porque ela – a Bertina – ainda estava falando normalmente como se nem tivesse notado aquilo. Acho que dos três carros que passaram, três buzinaram freneticamente. Tá que eu devia estar andando bem lento e meio torto, mas não é fácil carregar aquilo e direcionar, mas a rua é larga, na verdade é uma avenida e tinha espaço à vontade para os carros passarem, os três juntos, aliás – ou seja, transito nenhum – e juro que não entendi a necessidade disso.

Então a gente caminhava, alguns encaravam, alguns ignoravam o “Bom dia!”, alguns buzinavam, alguns ofendiam e a nossa conversa continuava e meus pensamentos também.

“Se em Lorena que passaram três carros e dez pessoas eu já me senti tão mal por ver tanta careta, imagina em São Paulo? Como se sentem?”

A Bertina, na verdade, parecia normal. Pensei em perguntar sobre isso, mas fiquei com receio de ser rude ou mesmo de cortar sua alegria enquanto contava sobre sua neta e falava sobre internet e tecnologia, assunto que ela entendia bem melhor do que eu.

Aliás, ela entrou nesse assunto porque antes eu havia comentado como puxar aquela carroça era algo pesado, que ela devia estar cansada, e que eu não sei se conseguiria andar com aquilo por tanto tempo quanto ela provavelmente ainda iria andar.

- Ah isso aí é porque os jovens hoje estão mais acostumados com a internet, ficam sentados e usam mais o cérebro que os braços, mas é bom, porque hoje a sociedade precisa muito mais de alguém que saiba mexer em um Photoshop ou em um Linux do que quem sabe puxar carroça! Já eu desde criança uso os braços, as pernas, mas se quero ver vídeo no Youtube demoro anos pra conseguir digitar! – e deu uma risadinha parecida com um “hehe”.

Achei bem atípico ver uma senhora, que até pouco tempo antes estava puxando uma carroça, falando de Photoshop, Linux e Youtube – achei ainda mais incrível porque ela pressupunha que eu era dessa geração jovem e “antenada” que se entende muito bem com a tecnologia e estava achando igualmente atípico ver uma jovem que mal sabia mexer em um celular.

Era um pouco irônico que eu, a “jovem”, era a pessoa desinformada e ela, a “senhora”, falava com tanta propriedade de programas que eu conhecia, mas não dominava – o que fui extremamente sincera com ela:

- Não sei mexer nem no Photoshop nem no Linux, mas gosto do Paint. – eu ri, mas é a verdade.

- É... amiguinha. Paint acho que também não dá muito futuro não! – rimos juntas, mas é: até agora, não deu mesmo.

A gente se despediu quando chegamos à rodoviária e ela seguiu como se nada houvesse mudado – o que pode ter sido só uma impressão porque ela sempre manteve a mesma postura sobre todo o momento que compartilhamos. De qualquer forma, para mim mudou. Bastante. Me senti meio "Gugu Liberato" mas fiquei feliz em conhecê-la e acho que ela ficou feliz em não ter que carregar a carroça por um tempo. Então saímos as duas sorrindo. O resto do meu dia continuou incrível, mas fiquei pensando sobre o que ocorreu.

Encontrei a minha irmã e seguimos nosso caminho, sem ninguém encarando “com a cara torta”, ninguém me chamou de idiota e resolvi fazer o teste do “Bom dia!” e adivinhem? Todos responderam.

Escrito em maio de 2010

quarta-feira, 27 de setembro de 2017

PÁÁÁ...

Novo item para a lista de acidentes inexplicáveis: ser atropelada.

Ontem eu fui tirar foto da fachada do meu trabalho para um projeto da minha irmã. Em frente estava estacionado um carro em nossa vaga, me ajeitei e bati a foto mesmo assim - até que apareceu uma moça levemente escandalosa berrando:

"EI! EEEI! Eu já ia tirar o carro, eu já estava saindo, NÃO PRECISA TIRAR FOTO NÃÃÃÃO..."

Enquanto ela berrava eu disse que não estava batendo foto do carro e sim da fachada...
Mas acho que ela não ouviu, entrou no carro e aparentemente ia seguir para a rua...
Até que...
PÁÁÁ...
Me atropelou.

Na verdade ela estava fazendo uma super manobra radical para colocar o carro na vaga certa e eu de costas não a vi, ela não viu, quando vi já estava ali chorando elegantemente. Me recompus como uma senhora de 80 anos com dor nas costas e entrei na loja. A Val (que trabalha comigo e viu tudo) me recepcionou com amor:

"COMO VOCÊ CONSEGUIU SER ATROPELADA NA CALÇADA, HARUMI?! Por um carro manobrando?? Você ultrapassa todos os conceitos de uma pessoa anormal!!"

"Mas dessa vez não foi minha culpa, Val :( Não briga comigo :( Eu tava ali parada com o celular e acho que a moça tava brava e..."

Fui interrompida pela a moça que entrou na loja escandalosamente e começou a berra de novo:

"VOCÊ TÁ BEM? EU TE ATROPELEI, NÉ? EU ATROPELEI ELA, NÉ?"

"Sim." Eu e a Val respondemos.

"ME AVISARAM E LARGUEI MEU FILHO ALI...VOCÊ TÁ BEM? TE MACHUQUEI? TA DOENDO? CÊ TÁ CHORANDO? AAAH ME DESCULPAAA"

"Eu to bem...que bom que você é um ser humano bom e veio pedir desculpas e ver se estou bem, obrigada."

"Por te atropelar?"

"Não...por ser voa, achei que você estava brava e tinha feito de maldade porque achou que eu estava tirando foto do seu carro..."

"NÃÃÃO IMAGINAAA, FOI SEM QUERER!! QUE HORRÍVEL, JAMAIS FARIA ISSO...EU SÓ NÃO TE VI MESMO, VOCÊ É MUITO PEQUENININHA E QUANDO DEU O TRANCO ACHEI QUE FOSSE A CALÇADA..."

"Tudo bem, to bem mesmo, to até feliz! Pelo menos você tem coração, né? Mais do que eu imaginei ao menos. Mas não precisa abraçar, não, flor..." (porque as costas estavam um pouquinho doloridas e ela tentando me fazer carinho estava esfregando a chave em mim).

"Então fico aliviada. Me desculpa mesmo! Mesmo, mesmo! Se você precisar de algo eu to aqui do lado...estacionada ali direitinho." (e de fato ela estacionou bem dessa vez, não era uma vaga fácil)

Aí ela saiu e minha chefe gritou lá de cima:

"Você está bem, Karen? Achei que a gente já ia ter que te levar pro hospital de novo!"

...

Mas algo bom saiu disso: com essa experiência eu vi que nem sempre as pessoas são más e vingativas, às vezes elas só são distraídas como eu, mas com uma Pajero 4x4.


Escrito em setembro de 2016

sexta-feira, 22 de setembro de 2017

Na Bardaria

18h30.

Deu o horário para encontrar as Bias. Sai correndo e fui a primeira chegar, o que particularmente eu gosto. Sentei na calçada, a Bia Yumi foi a segunda a chegar e logo depois a Bia Lena.

Primeiro jantamos no Lamen-Açu: Yumi pediu Shoyu Lamen, porque ela gosta dos simples, Bia Lena pediu Miso Lamen, porque ela gosta dos tradicionais e eu pedi o Amazon Lamen porque eu gosto dos estranhos.

Rimos, comemos, conversamos, rimos, bebemos, conversamos, rimos, comemos, pagamos.

De lá fomos para o Sukiya comer sobremesas.

Rimos, comemos, conversamos, rimos, bebemos, conversamos, rimos, comemos, pagamos.

De lá fomos para uma bardaria (um bar meio padaria hehe me senti genial com este trocadilho!) que não sei o nome. O lugar mais exótico de todos que fomos nessa noite. Tinha uma moça andando vestida de unicórnio (com chifre, peruca e vestido temático), tinha uma família tradicional jantando, tinha casal brigando, tinha casal se pegando, tinha homens que a única companhia era o copo de pinga, tinha um senhor comendo sanduíche como se fosse 7h da manhã (apesar de serem 2h da manhã), tinha uma senhora que a gente tinha certeza que veio direto das gravações de Harry Potter com seu penteado peculiar, tinha crianças correndo, tinha uns motoqueiros sem moto. Enfim, tinha uma grande diversidade de pessoas, incluindo nós!

Rimos, comemos, conversamos, rimos, bebemos, conversamos, rimos, comemos, e antes de pagar me veio o pensamento de como aquela noite estava sendo incrível.

(depois de pagar a sensação continuou hahah É só que aquele foi o momento que me desconectei um pouco de tudo que estávamos conversando, rindo e compartilhando para me concentrar em achar o cartão - e essa brecha me permitiu perceber a alegria que eu sentia em estar ali, naquele momento)

O que tornava aquele momento sensacional (além daquele cenário com figurantes espetaculares que foram um diferencial para a nossa memória e para a cinematografia da história) era o fato que estávamos em três pessoas que se gostam muito, se conhecem muito, se preocupam muito uma com as outras, apreciam a companhia e os conselhos uma das outras, com muitas histórias pra contar, vontade de ouvir e que conseguem transformar qualquer assunto em algo interessante para se conversar (qualquer mesmo: Instagram, política, meritocracia, Cabify x 99 Taxis, diálogos do Whatsapp, comidas boas, comidas ruins, música, histórias do passado, relacionamentos, pessoas bonitas, cabelos, falta de cabelos, maquiagem, Lojas Mel e uma infinidade de assuntos que possa caber dentro da definição de "qualquer coisa"). Tínhamos muito amor se personificando em detalhes como indicação de doces, internet roteada e aguardar os motoristas todas juntas e ter certeza que ninguém iria ficar em nenhum momento sozinha.

Eu - que sempre gostei da ideia de momentos mágicos por causa do destino, das coincidências e fico falando como tudo é cósmico (eu sei que é chato gente, estou parando) - de repente percebi que o o que realmente tornava o momento mágico e incrível era só o fato de nós três nos gostarmos e querermos estar ali, se divertindo, sem pretensão de ser mais descolada do que já não somos, mais inteligentes, mais bonitas ou mesmo menos confusas.

Querer estar exatamente onde você está, ficar feliz por ser quem você é, vivenciar o momento despretensiosamente e apreciar as companhias que temos torna tudo mais mágico do que qualquer coincidência que possa acontecer. Ontem não nos encontramos por acaso ou pela força do cosmos, marcamos e ali estávamos e foi mágico exatamente por ser assim :)

Não foi o local, a comida ou o evento que tornou aquela noite legal, mas sim as companhias. Uma noite comum (desconsiderando algumas pessoas que estavam fazendo parte do cenário) foi uma das mais legais de todo esse ano. Tem dias, como ontem, que eu vejo que a gente não precisa de muito pra ser feliz, só precisamos dos amigos certos.

Escrito em setembro de 2017

segunda-feira, 11 de setembro de 2017

Temaki

Ontem foi um dia atípico.

Primeiro tivemos um mistério meio Sherlock Holmes no trabalho com um cliente fantasma, que pode nunca ter realmente existido. E logo após o trabalho eu tinha combinado com a minha irmã de irmos juntas à uma palestra que ela foi convidada.

Como estou com um aparelho celular que só me permite ter 2 aplicativos por vez e eu não escolhi nenhum aplicativo de trasporte, tive que pedir ajuda para a minha mãe solicitar um táxi para mim.

Já estava meio escuro e o movimento meio escasso, resolvi aguardar o táxi em um ambiente mais movimentado e acolhedor, escolhi a Cobasi na Giovanni Gronchi.

Estava eu lá na porta com o celular procurando a numeração do prédio quando surgiu um moço de bicicleta meio afobado, falando alguma coisa que eu não entendi logo de cara porque ainda prestava atenção na minha mãe falando do outro lado da linha. Foi só quando ele mexeu no casaco para tirar algo que eu comecei a ignorar minha amada mamis para prestar atenção no que ia acontecer ali.

Eu já estava tensa, respiração ofegante, quando TCHARÃ: o moço tira um mini-mini-mini gatinho preto de patinhas brancas e coloca no meu braço "Você está entrando aí? Deixa com eles? Cuida, por favor?"

"Oi? O que é isso? Que aconteceu?" - eu estava meio aliviada que era um gato, mas também não estava entendendo muito aquilo andando em mim. Eu REALMENTE pensei que aquilo podia ser uma nova estratégia pra fazer eu segurar o gatinho e soltar o celular.

O moço respondeu: "Tinham dois gatinhos na rua, mas o carro atropelou um e consegui salvar esse e trouxe aqui. Muito obrigado!"

Ele falou já saindo.

Foi tudo muito rápido. Essas frases todas não devem ter levado 2 segundos para serem ditas e eu respondi "Cuido sim." - mas totalmente no reflexo (maaaaano, meus reflexos são péssimos e sempre me fazem tomar as decisões mais ingênuas).

O gatinho começou a entrar no meu casaco quando me toquei que a minha mãe estava berrando do outro lado "KAREN, QUE ACONTECEU? RESPONDE! VOCÊ NÃO PODE MAIS CUIDAR DE NENHUM GATO! KAREN QUAL O NÚMERO DAÍ? SUA IRMÃ TÁ ESPERANDO! KAREN CÊ TÁ VIVA?"

Entrei na Cobasi, pedi o número do prédio para uma funcionária, respondi minha mãe, desliguei e contei a situação do gatinho - tudo no automático.

"Aqui a gente não aceita animais, não."

"Eu sei, mas não tem alguém que vocês possam ligar? Alguma ONG?"

"Só tem uma moça que às vezes aparece de terça, mas hoje não tem não. Vai ter que levar com você!"

"Moça, eu não posso. Estou indo para uma palestra e eu já tenho duas gatinhas em casa. O gatinho pode ficar ao menos essa noite em algum lugar seguro aqui e amanhã eu venho resolver isso mais cedo?"

"Não. E se você deixar aqui eu vou te denunciar porque abandono de animal é crime."

Enquanto isso o gatinho já tinha explorado todo o meu casaco e mastigado metade do meu cabelo.

Resumindo: por 5 minutos ficamos nesse diálogo vai e volta até eu ficar ali parada na porta com o gatinho me olhando todo fofinho e eu tentando não olhar de volta, pensando que eu não podia levar o gatinho comigo, mas eu também não podia deixá-lo ali.

Aparecia gente perguntando o que estava acontecendo, mas ninguém podia ajudar.

Eu já estava chamando de "meu amor" e pensando em que nome de comida eu ia dar pro animalzinho que combinasse com aquelas patinhas brancas.

Aí minha mãe mandou mensagem.

Eu tinha pouco tempo.

Bateu a racionalidade que eu não tenho como ter outro gatinho e implorei mentalmente para o universo me ajudar a encontrar alguém para cuidar dele, quando... TCHARÃ 2: uma outra funcionária da Cobasi me viu lá na porta parada com uma expressão provavelmente não comum perguntou o que estava acontecendo.

"Você está doando esse gatinho?"

"Acho que sim! Preciso encontrar um lugar pra ele ficar!"

"Que perfeito! Esses dias mesmo a minha sogra comentou que desejava um!"

Por 1 segundo eu fiquei feliz.

Mais 1 segundo e eu parei pra pensar.

Eu sei que não estava em condição de selecionar "cuidadores" pro gatinho, mas eu também pensei que ele era pretinho e que recentemente uma amiga adotou um gatinho preto porque são os que as pessoas mais fazem maldades.

"Pô, mas ela trabalha na Cobasi, deve gostar de animais" eu pensei.

Mas eu já ando tão sem fé no mundo que me respondi com meu lado teorias da conspiração "E SE ELA TRABALHA AQUI SÓ PRA PEGAR GATINHOS E FAZER MALDADES SEM NINGUÉM SUSPEITAR?"

Mal concluí o pensamento, nem precisei verbalizar, uma outra funcionária que veio ver o que estava acontecendo falou:

"Você não podia deixar com ninguém melhor! Essa aí sempre que vê um animalzinho quer levar pra casa, finalmente aconteceu! Essa aí ama mais os animais do que gente!"

E aí a própria Marcilene (ou Marilene, foi tudo tão emocionante que eu não lembro o nome dela) disse:

"Na verdade é pra minha sogra, né? Mas se ela não quiser, ou não conseguir cuidar, fica comigo mesmo. Já tenho uma gatinha, vai fazer companhia! Vou avisar meu marido que hoje não volto de ônibus! Pode ficar mais tranquila. Qualquer coisa eu sou a Marcilene (ou Marilene) e eu fico ali no setor de aves, sempre que você quiser saber do gatinho, passa lá!"

E o dia continuou atípico, muitas, muitas, muitas coisas menores aconteceram, mas a sincronia de tudo nesse dia foi espetacular. Foi a terceira ou quarta vez que algo assim aconteceu tão instantaneamente. Eu pedi e aconteceu.

Ontem deu tudo certo.

Ajudei um gatinho a encontrar um lar.

Ajudei o moço que tava pedalando tudo torto, tentando coordenar como andar em uma avenida movimentada sem morrer enquanto resgatava um gato extremamente serelepe.

Ajudei a mim mesma a lembrar que tem dias que estamos "no lugar errado na hora errada", mas também há dias que estamos "no lugar certo na hora certa".

Eu vi uma cadeia gigantesca de amor e bondade ali e fiquei muito feliz de fazer parte. Vi um coletivismo espontâneo e uma dependência em confiar no outro sem saber realmente o fim da história. Essa "confiança" foi a única ponta solta que estava quando saí dali.

Na palestra ainda, por fim, vimos a história do Delfino Golfeto, fundador da Cachaçaria Água Doce que estava lá contando como seu negócio surgiu e cresceu e ontem celebrava 25 da sua primeira franquia em Ourinhos. A Sayuri, ficou bff da esposa dele - a história deles é bem bacana (tão boa quanto a história da Cachaçaria) - e no final a esposa dele, depois de nos contar a sua própria trajetória, ainda disse "Vocês precisam estar com alguém que vocês confiam. Confiança é a base dos bons relacionamentos. É dar o seu melhor para dar certo e acreditar que o outro também está dando o seu melhor."

Tá, que ela falou isso com relação ao casamento dela com o Delfino. Mas eu ouvi como se fosse o nó final na história do gatinho (que eu apelidei de Temaki, porque tinha patinhas e boquinha brancas com narizinho rosado que nem um salmão hahah).

A gente tem que confiar pra ter um bom relacionamento com o mundo.

Enfim, escrevi só pra compartilhar essa alegria porque nos últimos dias eu estava com umas histórias meio de desgraças e achei que era bom falar também das pequenas boas coisas (tão surpreendente quantos as grandes merdas) da vida.

Escrito em agosto de 2017

segunda-feira, 21 de agosto de 2017

Começando a escutar as dicas que me são dadas

Pessoa
[...]
Eu escrevi errado de propósito, aí que tá a graça rs
Sério que você não sacou?

Eu
não
achei que você tinha digitado errado sem querer e não eprceebu
eu faço isso as vezes

Pessoa
A não.
É a linguagem dos jovens, é a versão atualizada do kkk

Eu
até hj não saquei a do kkk - e olha que eu adoro a letra K pq é a letra do meu nome
mas enfim
já erro tanto escrevendo e falando, se não são os meus dedos que não acompanham as minahs ideias é o meu cperebro, então se sem me esforçar já sai tudo errado, não vejo razão para isso de propósito
ia ficar ainda masi difícil de me comunicar

Pessoa
Se escreve tão errado assim não devia corrigir então né

Eu
não corrigi, só perguntei pq eu realmente não tinha entendido

Pessoa
Quando for assim responde com "rs"

Eu
odeio "rs"
por isso que desisito de socializar

Pessoa
Você "desisite" propositalmente ou por erro de digitação?

Eu
desisto*

Pessoa
É, só volte quando o erro for proposital, vc ainda não está preparada a internet migs
Pro seu próprio bem



Escrito em julho de 2017

segunda-feira, 24 de julho de 2017

Déjà vu (de novo)

A arte de levar aproximadamente 28 minutos para decidir o que assistir no Netflix e então escolher uma opção que parece bacana e pensar "tem algo familiar nesse filme, eu acho que eu já vi algum pedaço dele antes, mas eu devo ter dormido no meio porque não lembro do final".

E então assistir.

E então conseguir me manter acordada por todo o filme.

E então quando está quase no finalzinho perceber "nossa, mas eu to acertando todas as coisas que acontecem nesse filme" e se sentir o máximo até cair a ficha que você não só já viu esse filme, como achou o final uma porcaria - e dá uma baita sensação de déjà vu do déjà vu, porque aí cai outra ficha que: não é somente a segunda vez que você já assistiu esse filme, mas é SEGUNDA VEZ QUE VOCÊ ESQUECEU QUE JÁ VIU ESSE FILME E ASSISTE DE NOVO (essa última vez, na verdade, foi a terceira vez que eu vi) - ou seja, você não é o máximo.

Obs.: Infelizmente isso não é uma metáfora sobre nada na minha vida, é um situação real com um filme com final bem bobo e sem graça.

Obs. 2: Mas se pensar bem, até funciona como metáfora também.

Escrito em julho de 2017

quarta-feira, 28 de junho de 2017

Retorno de Saturno

Dentro de um Uber com a Yumi conversando sobre a vida, questionei.

"Você acha que fui muito louca?"

"Nãããão. Nããão. Não. Não...É. Você é louca, né? Mas neste caso eu acho que você foi muito corajosa, na verdade."

"Acho que exigiu um pouco de coragem mesmo."

"Muita! Você é muito corajosa! Uma coisa que nunca poderão falar de você é que você é covarde. Você é uma das pessoas mais corajosas que conheço, mas você precisa entender que as pessoas no geral são covardes. Por isso você é tão diferente, e isso às vezes pode ser considerado loucura porque as pessoas não conseguem se ver tomando este tipo de atitude. Geralmente estamos acostumados a simplesmente deixar, a não agir e evitar confrontar algo ou alguém que às vezes nos faça pensar muito em algo que é tão confuso dentro da gente, como os nossos sentimentos."

"Foi bem confuso mesmo."

"Claro que foi! Mas o bom é que você foi sincera com você mesma! Fez exatamente o que estava com vontade de fazer na hora sem afetar o que você também sabia que precisava ser feito pela Harumi do Futuro. Aliás, de tudo que você contou, essa foi a parte que eu mais achei doida: VOCÊ, HARUMI, nossa arianinha impulsiva que não consegue pensar no que fazer daqui dois dias, pensou no impacto disso pra você a longo prazo e não escolheu ficar na situação cômoda de viver um dia por vez como se não houvesse amanhã, por que um dia de fato não terá - mas em todos os outros dias da sua vida tem um amanhã, sim. Você entende o que eu estava falando antes? Essa sua mudança de comportamento, essa coisa de parar de só pensar no presente, isso tudo que está acontecendo: é o Retorno de Saturno!"

Elogios (e conceitos do Retorno de Saturno que eu não manjo tanto assim para opinar sobre) à parte, a Yumi é bem sábia, né? Sempre me impressiono.


Escrito em junho de 2017

segunda-feira, 19 de junho de 2017

SÃO BORJA, pt II

SÃO BORJA, pt II
Como Descobrir Que A Praga Continua Em Você

(São Borja, pt I aqui)

Situação: Trabalho.

Cenário: Aduana da Fronteira entre Brasil e Argentina em São Borja (parece uma rodoviária, tem um prédio central e ao lado duas partes cobertas, mas abertas, onde entram e saem os carros passando pela inspeção para entrar ou sair do Brasil/Argentina).

Perfil: Eu era supervisora de uma equipe de pesquisa para o Ministério do Turismo (sintam a pompa novamente, porque daqui a pouco ela some...novamente).

Época: Verão de 2015.

Acontecimento: Então é assim...

Em 2012 fui trabalhar em São Borja e relatei um super esborrachamento que tive. Caí de costas na quina da calçada na Fronteira durante um temporal, fiquei com as costas travada e lama no ouvido. Além disso perdi o sapato.

Mas em 2015 a Praga de São Borja continua...

Então eu voltei pra cá pelo mesmo trabalho e há uns dias atrás eu pensei "como está quente no quarto, vou abrir esta janela (pesada, velha e gigante) do hotel". Agora eu sei que não foi esperto, mas na hora não parecia algo que eu seria incapaz de conseguir fazer - no entanto era: quando eu estava quase conseguindo abrir (ela estava emperrada), ela fechou em cima do meu dedinho, que está roxo, verde, azul, inchado e torto, além de muito dolorido. Fui no hospital e me chamaram de Karine Naram (será que eu falo o meu próprio nome errado? Porque aqui nas cidades da Fronteira do Rio Grande do Sul nunca acertam a pronúncia), marcaram que eu nasci em 2012, arrumaram a data porque claramente não pareço tão jovem assim a ponto de ser confundida com uma recém-nascida e fizeram o curativo.

Então ontem eu dei uma tropeçadinha durante o trabalho e fiz a piada "Só falta eu não moer o dedo na janela, mas quebrá-lo caindo em cima dele! Tem que ser muito lerda, né? ha-ha-ha".

A graça estava na certeza de que isso não aconteceria. Porque de fato seria muita lerdeza.

Mas pouco depois, eu cai sozinha no chão. 

Sozinha. 

E em cima do dedo. 

Não tinha vento, não tinha chuva, não tinha paralelepípedo, calçada, barro, chão molhado, não tinha nenhuma desculpa...só o asfalto que me ralou toda. Voltei ao hospital  e as pessoas me perguntavam se caí de moto, de bicicleta, se caí no barranco, fui empurrada ou se caí do cavalo (isso parece comum lá).

"Não, eu caí sozinha"

"Tem certeza?"

"Tenho."

Na recepção a moça que estava fazendo minha ficha começou a rir porque minha residência tinha sido marcada como o próprio hospital (pela outra moça que marcou que nasci em 2012) e soltou seu bom humor de alguém não ralado e com o dedo intacto:

"Pelo menos já tá em casa, né? Tem certeza que tu não foi atropelada? ha-ha-ha".      

Fiz os curativos, descobri que o enfermeiro conhecia Lorena (a cidade onde cresci), que ele era meio sádico ("Olha aqui eu tirando as pedrinhas no seu machucado! Quer ver?! Tem um monte!") e disse que já viu uma pessoa que foi pisoteada por um cavalo que se machucou menos e ficou abismado como consegui fazer isso sozinha (pensando depois, pelas perguntas e o rumo que ele levou a conversa, acho que ele estava preocupado se eu havia sofrido violência doméstica ou algo assim - o que sempre é uma preocupação válida e bacana).

Perguntaram se eu era parente da Carol Nakamura (e fizeram essa piada umas 10x, pq São Borja não tem muitos orientais e não conseguiam pronunciar Karen Nomura sem hesitar em alguma sílaba) e, enquanto eu esperava para ser atendida pelo médico, a moça da ficha que no fundo é uma querida (como dizem aqui) cruzou meu caminho e finalizou esta saga com sua visão positiva da situação:

"[...] Alguém lá em cima gosta muito de ti, tu conseguiu se esfolar toda mas sua roupa tá inteirinha! Como isso, né? É sorte!"

Geralmente eu abraçaria esta visão, mas como estou muito dolorida me permiti pensar:

Aham.

Deve gostar pra caramba.

Muita sorte.



Considerações posteriores

Obs.: No hotel eu vi que a calça rasgou.

             
Considerações finais

Beijos pra todos e não caiam ou deixem a janela fechar em seus dedos, pode ser chato, dolorido e inconveniente.



Escrito em janeiro de 2015

sexta-feira, 16 de junho de 2017

Medo de abraçar

Estava voltando para casa depois de um dia comum de trabalho, quando antes de antes de ontem, eu e minha grande mochila esbarramos em alguém.

...E quebramos um pouco nossa rotina.

A princípio eu nem notei quem era, mas eu senti o tranco e no automático pedi desculpas para quem estava à minha esquerda. Com o meu fone de ouvido, confesso que foi uma ação automática e não esperava nenhuma resposta além das variáveis de "tudo bem" ou "imagina" ou mesmo um xingamento, mas quando olhei vi que o menino estava falando algo.

Era um rapaz não muito mais velho do que eu, talvez até mais novo. Estava com uma roupa bem desgastada, mas de certa forma "estiloso" (isto me faz lembrar da minha irmã falando que o estilo está muito mais na presença da pessoa do que no que ela veste). 

Como pela minha rápida leitura labial aquilo parecia uma frase maior do que qualquer uma das frases que eu esperava, eu tirei o fone.

"Desculpa, eu não escutei." Eu disse.

"Eu tinha perguntado se você não ia me ignorar."

Ele disse isso com uma mistura de "cara de nada" com "sorrisinho de educação", aquele sorriso que os olhos não se mexem, só as bochechas que se levantam levemente. A pergunta me pareceu tão estranha que eu continuei com a mesma cara em silêncio, o que fez parecer que na verdade eu estava ignorando. Quando caiu a minha ficha sobre isso eu respondi:

"Desculpa, eu não entendi. Te machuquei? Você precisa de alguma coisa?"

Aí quem ficou em silêncio foi ele, mas a cara dele não estava a mesma. Agora ele também sorria com os olhos e arrisco dizer, com o coração.

"De mais pessoas como você."

Agora o silêncio veio de ambas as partes.

Foi uma boa resposta que ele deu, não foi? Eu achei.

Normalmente eu demoro para entender frases pouco contextualizadas, e por isso mesmo, por um segundo eu achei que não tinha entendido direito.

"Oi?"

"Eu preciso de mais pessoas como você." Ele repetiu.

Não sei quem lacrimejou primeiro, eu ou ele.

Eu nem sabia direito porque estava lacrimejando e como aquilo me afetou tão rápido. Mas de repente o contexto parecia óbvio.

"Ninguém nota a gente, muito menos liga se a gente precisa de algo. Foi legal."

Eu sorria demonstrando empatia, mas continuava quieta porque eu não sabia o que dizer.

"E pensar que eu tava sendo sarcástico contigo e você nem notou. É que sem amor o coração vira pedra e a gente começa a ficar meio assim. Aí um pouquinho de amor que você deu e já to todo sensível (ele ainda estava lacrimejando). Foda o ser humano, né?"

Ele tentou me abraçar e ele mesmo se embananou e se reprimiu... "Tanto tempo que ninguém nem me nota que acho que até esqueci como faz isso."

Eu continuei imóvel pelos 2 segundos que tudo isso aconteceu.

Tão logo ele seguiu o caminho sorrindo e dando tchau, fiquei com isso na cabeça: se devia tê-lo abraçado bem forte de verdade. O pensamento foi evoluindo e me perguntei quanto tempo devia fazer que ele não recebia um abraço. Pensei em como eu gostava de dar e receber um abraço e que é uma das coisas que faço automaticamente quando estou feliz! E ele parecia feliz! Teria sido bacana!

Como é ruim ter medo de abraçar, não é?
Eu não me acostumei com isso, eu sempre fico triste quando penso que a nossa condição social às vezes determina até quanto amor a gente recebe. Espero que ele logo tenha várias oportunidades de se lembrar como é abraçar alguém, inclusive eu mesma se eu não paralisar novamente.


Escrito em janeiro de 2017

sexta-feira, 9 de junho de 2017

Meu namorado Shazam

Esta semana, de forma semi-impulsiva, comecei a academia.
E esta foi uma das primeiras interações (com pessoas) que tive neste novo ambiente:

Eu
"Que música é essa que tá tocando?"

Instrutor
"Eu não conheço..."

Eu
"Peraí."

Peguei o celular e...

Instrutor
"Ká!! Você não pode interromper a sequência pra ficar de conversinha no celular! Tem que ter foco!"
(ele disse isso de forma simpática apesar das exclamações)

Eu
"É rapidinho, só o Shazam!"

Instrutor
"ESSE é o nome do seu namorado?!"

Eu
"N~~ãã~ãaãaoo (mas seguindo a lógica das pessoas que já gostei na vida, poderia muito ser)! É o aplicativo mais sensacional do mundo pra descobrir a música que tá tocando! Ó! Pronto! Você disse que não conhecia! A música já estava acabando, se eu não pegasse agora eu ia passar o resto da minha vida procurando! Sério! Eu tenho tique com músicas...Não ia conseguir focar em nada até encontrá-la!"

Instrutor
"Eu realmente ia achar isso menos estranho se fosse o nome do seu namorado."


Em resumo: Estou feliz de ter começado na academia. Se eu não ficar mais saudável, ao menos tenho uma nova música legal na minha playlist.



Escrito em junho de 2017

Música encontrada pelo Shazam, meu namorado

Fitz and the Tantums - HandClap

quinta-feira, 9 de março de 2017

SÃO BORJA, pt I

SÃO BORJA, pt I
Como Descobrir Que Rogaram Uma Praga Forte Em Você

Situação: Trabalho.

Cenário: Aduana da Fronteira entre Brasil e Argentina em São Borja (parece uma rodoviária, tem um prédio central e ao lado duas partes cobertas, mas abertas, onde entram e saem os carros passando pela inspeção para entrar ou sair do Brasil/Argentina).

Perfil: Eu era supervisora de uma equipe de pesquisa para o Ministério do Turismo (sintam a pompa, porque daqui a pouco ela some).

Época: Verão de 2012.

Acontecimento: Estava eu e uma das minhas pesquisadoras reclamando do calor de 42°C lá na fronteira quando começou a chover e ficamos felizes com a possibilidade do tempo refrescar um pouco. Estávamos sentadas em um banco de madeira em frente a uma das cabines onde ficavam os policiais responsáveis pela inspeção na aduana. A área é coberta, mas aberta.

Eu estava de pernas cruzadas segurando várias folhas da pesquisa que eu estava corrigindo enquanto conversávamos.

Tão logo finalizávamos nossas reclamações (enquanto esturricávamos mesmo na sombra) começou a cair uns pingos e uma brisa bateu no nosso rosto. Achei que os céus haviam atendido nossos pedidos...
             
Eu
"Ah, é bom que refresca!"

Pesquisadora
"É! É bom mesmo, mas tá ficando forte, né?"

Eu
"Naaada! Ontem choveu assim e logo parou, fica indo e vindo, tá normal, só tá fazendo barulho porque tá chovendo granizo."

Sim, durante esse pequeno período de diálogo os pingos se tornaram pedrinhas de gelo. E além disso, queria ressaltar que a pesquisadora morava na região, mas era eu que estava achando que já conhecia tudo sobre o clima local baseado na única semana que eu havia passado ali até então. 

Relembrando da situação, acho que aqui que estava o erro.

...e em DOIS SEGUNDOS a chuva virou um super temporal e todos os são borjenses e argentinos, ligeiros e acostumados, correram em UM SEGUNDO para a parte coberta e quem ficou pra trás?

Resposta: Karen, a veloz - que todos os dias usou roupas verdes, azuis, rosas, vermelhas, mas neste dia usou branca. 

Contudo isso não foi o suficiente...

Eu pensei 
“Por que não cair aqui na aduana na frente dos policiais federais (que procurava manter uma boa relação e uma postura condizente com meu cargo), desse monte de turista e das minhas pesquisadoras que AINDA me respeitam? VOU CAIR.” 

Mas mais do que isso eu pensei 
“Mas por que cair normal?? VOU CAIR CINEMATOGRAFICAMENTE QUE NEM AQUELES DESENHOS RIDÍCULOS QUE PISAM NA BANANA (só que não tinha banana - então ficou mais ridículo ainda) E CAEM COM AS PERNAS PRA CIMA E BATEM AS COSTAS NO CHÃO!”

E assim o fiz.

...Foi quando todo o meu material começou a voar no melhor estilo “Twister” e eu, muito esperta como sou, resolvi levantar e ir atrás das coisas! 

Porque ver a Karen caindo todo mundo já viu...mas ninguém viu a Karen voando céu acima e eu não podia deixá-los passar vontade.

Não consegui resgatar quase nada. Toda a nossa produção estava encharcada e enlameada. Quando desisti de salvar o que havia voado: a merda do vento me levou (DE VERDADE) e eu demorei 10 minutos pra fazer um trajeto de 10 metros e voltei com lama até no ouvido! Sério, aquele vento veio do inferno, era muito forte, tipo vento do Alasca naqueles filmes de terror (na verdade eu nunca vi um filme de terror que se passe no Alasca, mas se tivesse imagino que uma da cenas seria assim).

Fui resgatada (sim, uma pesquisadora veio me tirar do meio da chuva porque eu não conseguia chegar no prédio sozinha). Suja, levemente dolorida (até aquele momento), com a blusa transparente, envergonhada, fingindo que não notava os olhares das pessoas secas e agora, passando frio. Uma das pesquisadoras me indicou ir na enfermaria porque logo depois a minha coluna travou de vez e eu estava corcunda. Mas não era mesmo o meu dia de sorte (sim, demorou pra minha ficha cair), o responsável da enfermaria da Aduana havia saído pouco antes de eu entrar no prédio e tive que me contentar com um "toma um banho longo bem quente que a dor passa" de uma pessoa que provavelmente nunca caiu de costas na quina de uma calçada no meio de um temporal.

...Ah, mas a coisa não acaba aí! Porque eu perdi a sola do meu tênis e como sempre, sou muito precavida e só havia levado UM PAR DE CHINELOS HAVAIANA BRANCO E AZUL além do tênis, agora sem par. A cidade era pequena, final de semana o comércio não abria, e por dois dias tive que trabalhar em um dos dias com um tênis descolado (literalmente, a sola descolou e eventualmente o tênis inclusive saiu do meu pé) e outro dia com chinelo.

E não...ainda não acaba aí! Dois anos depois retornei ao mesmo destino para o mesmo trabalho e uma das minhas pesquisadoras atuais (que no dia do acidente ainda não havia trabalhado comigo), durante o treinamento antes de iniciarmos a pesquisa, olhou para mim sorrindo e disse: "Eu lembro de você..."

Eu
"Sério? Eu acho que lembro também, mas acho que não trabalhamos juntas na outra vez..."

Pesquisadora atual
"Na verdade eu trabalhava no posto de informação da fronteira, mas você não é a menina que caiu e perdeu o tênis no temporal?"

Sim, era eu. Trabalhei lá duas vezes. Duas vezes sem dignidade.

E calma!!! Ainda não acaba aí!!!

A praga de São Borja continua...

Mas vou deixar o final desta saga para depois (eu sei que estou parecendo o João Kléber, mas a próxima história é igualmente longa e acho que é o caso de ter um espaço só para ela - então podem tomar uma água, apreciar a natureza e voltamos após o reclame!).

To be continued...

Escrito em janeiro de 2012

terça-feira, 7 de março de 2017

O Prédio

Ontem, na chegada no Rio de Janeiro, à caminho do hostel.
(Era "ontem" quando isto foi escrito em 2011)

Eu
"Moço, o que é aquilo ali?"

Moço do táxi
" Prédio."

Eu
"Ah sim, mas de que?"

Moço do táxi
"Olha, acho que de concreto."



Eu acho que era o Teatro Municipal do Rio, e assim considerei :)

(Adendo de 2017 mas que poderia ter sido escrito dois dias depois deste diálogo: Sim, era o Teatro Municipal do Rio de Janeiro!)


Escrito em outubro de 2011

sexta-feira, 3 de março de 2017

A amante do Parque Dom Pedro II

Era 5 de outubro de 2011 quando notei como a cidade de São Paulo estava definitivamente dominando a minha mente e alterando as minhas referências históricas. Aqui está um trecho deste momento:

[...]

Eu
"Ah, tudo bem! Agora Inês é morta..."

A outra pessoa
"Que Inês?"

Eu
"Como assim que Inês? Inês de Castro!"

A outra pessoa
"...Inês de Castro? Eu, ahn, não lembro...acho que sei quem é, mas não tenho certeza. Ela é a que..."

Eu
"...A que era amante do Parque Dom Pedro e virou rainha depois de morta! Lembra?"

A outra pessoa
"Amante do Parque Dom Pedro II?"

Eu
"Isso!! Mas é o primeiro, não o segundo!"

Silêncio.
Troca de olhares estranhos.
Mais silêncio.
Reflexão.
Constrangimento e expressão:

Eu
"AAAAH!!! PARQUE! Desculpa! É só Dom Pedro!"


[Nota: Parque Dom Pedro II é um parque localizado no centro de São Paulo, entre os bairros Sé e Brás, onde há o Terminal de ônibus Parque Dom Pedro II - que eu utilizava com certa frequência nesta época.]


Escrito em outubro de 2011


quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

Comprar um apartamento ou um celular?

Saindo da padaria aqui do Morumbi, num dia com um humor extremamente péssimo, fui abordada por uma mulher:

- Você não deseja conhecer os nossos novos apartamentos na Rua Blablabla?

- Muito obrigada, mas não tenho interesse.

A moça entrou na minha frente e olhou nos fundos dos meus olhos:

- Isso é porque você não viu os nossos apartamentos! Dá uma olhadinha aqui no nosso panfleto!

Ela me entregou um papel que sei lá porque eu segurei, mas preferi ser honesta porque não havia rumo que aquela conversa pudesse levar que fosse produtivo:

- Muito obrigada mesmo, mas eu estou até em dúvida se compro um celular, definitivamente não estou considerando comprar um apartamento. [Adendo 1: Haviam roubado o meu celular (um dia antes, inclusive) e esse era um dos fatores do meu péssimo humor.]

- Mas quem disse que é pra vender? Agora é só pra dar uma olhadiiiiinha! As vendas só começam no final de março! [Adendo 2: Ela disse isso animada e sorridente, como se realmente tivesse dito algo que solucionasse todos os problemas do mundo.]

- Ah sim, claro! Mas infelizmente tem 4 quartos, acho que eu realmente não preciso de tudo isso, senão até deixava de comprar o celular e comprava o apartamento. [Adendo 3: Eu falei rindo porque não queria ser muito grossa, mas achei que era perceptível que eu estava sendo irônica, não?]

- Nããão. - ela respondeu

E continuou:

- Olha aqui! Temos com 3 ou 2 quartos também! Se você tiver um marido cada um pode ficar com um quarto, já que hoje em dia os casais valorizam mais a privacidade, né? Ou fazer de closet ou quarto pra visita! [Adendo 4: Este é o meu mundo: mais provável eu ter um marido que não queira dormir comigo do que eu ter filhos, por exemplo.]

- Ah que pena, eu não tenho um marido, mas se eu tivesse ele com certeza não iria querer dividir quarto comigo! [Adendo 5: Aqui eu não fui irônica, infelizmente.]

- Ai, amiga, você é hilária! Mas então você aproveita com suas visitas essa piscina com espreguiçadeira sob a piscina pra pegar uma cor com o pé na água ou pode malhar em uma das duas academias!

- Duas academias?

- É que o condomínio é enooorme e a academia é o point. E, olha, se você tá sem marido, é lá mesmo que você pode achar um!

- Hmm, me pegou! Mas se ele for do prédio é ruim que no final teremos 2 apartamentos com 2 quartos sobrando, né? Mas pode deixar que se eu casar até março ou se eu comprar muita roupa eu dou uma olhada lá!

Sorri. Não sei sou muito ruim com ironias ou se ela estava desesperada, mas ela continuou animada:

- Isso mesmo! Então estamos te esperando lá!

Quando ela me acenou e eu atravessei a rua confesso que sorri, e dessa vez não foi por ironia. Relembrei o diálogo e andei rindo (aquelas risadas que você dá com uma lufada de ar saindo do nariz mas sem abrir a boca e mostrar os dentes), e nem lembrei do mal humor. Eu estava errada, a conversa foi produtiva!

[Adendo 6: Dois dias depois, saindo da mesma padaria, outra moça segurando os panfletos do mesmo prédio falou "Leva seus pais lá pra conhecer! Temos os melhores colégios do bairro bem pertinho."  - Dessa vez eu só passei reto, mas concluí que o pré requisito para contratação deste serviço é julgar pela cara e tentar desenvolver um diálogo desprovido de noção. Além de eu ter notado a diferença que faz estar um dia com salto (e um marido que não quer dormir comigo) e no outro estar de tênis (e ter pais preocupados com a minha educação nos melhores colégios do bairro)!]

Escrito em fevereiro de 2017